O futuro de um mundo cada vez mais maduro

Dezembro de 2007. Milhares de pessoas, registra o Valor, ocupam as ruas de Atenas, na Grécia, para protestar contra a revisão do sistema público de aposentadorias, dando início a um movimento ainda hoje em curso no país. Na França, pelas mesmas razões, ao longo de outubro de 2010, ondas de manifestantes encheram as ruas de Paris, enquanto os sindicatos organizavam paralisações gigantescas. Em Wisconsin, nos Estados Unidos, neste mês, o governo estadual aprovou uma legislação de teor semelhante, provocando a ira de outros tantos cidadãos. Uma preocupação a unir todas essas pessoas é a aposentadoria.

Já há algumas décadas os países ricos enfrentam taxas de envelhecimento populacional nada desprezíveis, o que, para muitos analistas, implica impactos consideráveis nas contas públicas, sendo o corte de benefícios e o aumento da idade para se aposentar a receita mais difundida. A novidade nesse panorama é que alguns países emergentes, a exemplo do Brasil, estão se juntando a esse clube, com diminuição das taxas de natalidade e o aumento da expectativa de vida.

Foi a partir da leitura conjuntural desses e de outros fenômenos correlatos que o jornalista Jorge Félix resolveu pesquisar e defender uma dissertação de mestrado em economia política, cujo mote ele mesmo define como um estudo sobre a “economia da longevidade”. O resultado do trabalho acadêmico se transformou no livro “Viver Muito – Outras Ideias Sobre Envelhecer Bem no Século XXI”, publicado pela editora Leya.

Félix mostra em seu livro que, salvo poucas exceções, as sociedades globais não têm se preparado para lidar com o envelhecimento de suas populações e com as consequências desse fenômeno. Para ele, o Brasil se encaixa perfeitamente como um exemplo dessa maioria. “O país está envelhecendo muito mais rápido do que deveria, com taxas de fecundidade de 1,8 filho por família em uma ponta e o aumento da expectativa de vida na outra. O enfrentamento desse quadro se faz com a adoção de políticas públicas adequadas”, observa.

Ao analisar especificamente o caso brasileiro, o autor de “Viver Muito” assinala as diversas situações do cotidiano que indicam o quão pouco tem sido feito para se pensar e projetar a velhice de milhões de pessoas nas próximas décadas. “Ao caminhar pelas ruas das grandes cidades, podemos observar que tudo leva ao isolamento do idoso. O transporte público, por exemplo, não oferece a menor condição para que uma pessoa mais velha possa usar esse serviço no horário de rush.”

A tendência é que, com o tempo, as pessoas permaneçam mais anos no mercado de trabalho, o que aumentará a incidência desse perfil de usuários no sistema, afirma Félix. A melhora dos serviços públicos de saúde seria outra demanda a ser pensada de maneira estratégica.

Atualmente, 71% dos idosos brasileiros dependem do SUS (Sistema Unificado de Saúde). É natural imaginar que uma significativa parcela desse grupo, que aumentará nos próximos anos, não consiga arcar com planos de previdência privada ou com os custos de medicamentos sofisticados, mesmo que o país mantenha seu PIB evoluindo a taxas francamente positivas durante um longo período.

Um fator também bastante preocupante é o cultural. Diferentemente de países como o Japão e a Alemanha, a maioria das sociedades contemporâneas ao redor do planeta cultua a juventude, lidando muito mal com os desafios da velhice. O preconceito não se voltaria somente contra outros indivíduos, mas também contra a própria aceitação do processo pessoal de envelhecimento. Questões como a preparação de uma residência aparelhada para um idoso ou o incentivo à disseminação de profissionais qualificados para cuidar dessas pessoas passam bem distante dos debates públicos. Como no famoso hit da banda alemã Alphaville, todos parecem acreditar que serão jovens para sempre.

Mas o principal paradoxo apontado por Félix em seu trabalho remete ao ponto de partida deste texto. Enquanto diversos governos, por meio de seus bancos centrais, não veem muitos inconvenientes em liberar bilhões de dólares para massas falidas de instituições financeiras, a avaliação predominante não hesita em culpar os gastos com os aposentados como uma das principais fontes dos enormes déficits públicos nacionais. Em sua avaliação, essa economia extremamente financeirizada precisa abrir espaço para outros valores que atendam mais aos interesses comuns, como a economia da longevidade. O vaticínio de Félix é inequívoco. “A permanecer as condições atuais, o envelhecimento populacional em escala planetária significará apenas uma coisa: mais pobreza.” (Fonte: Diário dos Fundos de Pensão)